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terça-feira, 31 de março de 2015

Proteção


Na camisa de Vênus

 encontro energia

que à sanidade reforça

e impede que algum dia

eu precise da camisa de força.

 

Medo de viver


O medo no meu passado,

era um medo tão presente,

morria de medo da morte,

e de  partir tão de repente.

Hoje, não penso mais nisso,

pois, o que abala o meu ser,

não é mais o medo da morte

e, sim o medo de viver.


Do livro: sob o olhar  da poesia.

De: Ildebrando Pereira da Silva.

Falo de ti às pedras das estradas,


Falo de ti às pedras das estradas,
 E ao sol que e louro como o teu olhar,
 Falo ao rio, que desdobra a faiscar,
 Vestidos de princesas e de fadas;
 
Falo às gaivotas de asas desdobradas,
 Lembrando lenços brancos a acenar,
 E aos mastros que apunhalam o luar
 Na solidão das noites consteladas;

 Digo os anseios, os sonhos, os desejos
 Donde a tua alma, tonta de vitória,
 Levanta ao céu a torre dos meus beijos!
 
E os meus gritos de amor, cruzando o espaço,
 Sobre os brocados fúlgidos da glória,
 São astros que me tombam do regaço!
 
Florbela Espanca, in "A Mensageira das Violetas"

segunda-feira, 30 de março de 2015

Bilhete

J G DE ARAUJO JORGE

O teu vulto ficou na lembrança guardado,
vivo, por muitas horas!... e em meus olhos baços
Fitei-te – como alguém que ansioso e torturado
Tentasse inutilmente reavivar teus traços...
 
Num relance te vi – depois, quase irritado
Fugi, - e reparei que ao marcar os meus passos
ia a dizer teu nome e a ver por todo lado
o teu vulto... o teu rosto... e o clarão dos teus braços!
 
Talvez eu faça mal em querer ser sincero,
censurarás – quem sabe? Essa minha ousadia,
e pensarás até que minto, e que exagero...

 Ou dirás, que eu falar-te nesse tom, não devo,
que o que escrevo é infantil e absurdo, é fantasia,
e afinal tens razão... nem sei por que te escrevo!

Correr atrás?


Correr atrás? Jamais!       

Jamais, em toda a minha vida,

corri atrás de alguma coisa   

que por mim fosse pretendida

 

Não corri atrás de dinheiro,

do sonho, da felicidade. 

não corri atrás de sucesso,

 do amor e da liberdade.

 

Pois, uma coisa é certa,          

quanto a isso não me engano:       

 Por que correr atrás,                       

se na frente corre um queniano?

 

Por isso, não corro atrás de nada.        

Perguntam-me. - E  do prejuízo?     

 Só faria tamanha besteira,                  

se me perdesse do juízo.

 

Mas, não   fiquei parado,             

 esperando que tudo caísse do céu.             

 Fui sempre, direto ao encontro,.                                

 do que a Vida me ofereceu.
 
Do livro Sob o olhar da poesia
De: Ildebrando Pereira da Silva

domingo, 29 de março de 2015

Amar - Narração Miguel Falabela


Movido pelo medo


Tenho muita coragem
para contar um segredo:
A minha viagem,
É movida pelo medo.

O medo da guerra,
motra-me o caminho da paz.
O medo do fracasso,
mostra-me do que sou capaz.

O medo da prisão,
mostra-me a  liberdade.
O medo da mentira,
me faz encontrar a verdade.

 O medo do fogo,
me faz atravessar o rio.
O medo de perder,
me faz encarar o desafio.
 
O medo da escuridão,
me faz buscar a saída.
O medo da morte,
me faz lutar pela vida.

Do livro: Sob o olhar da poesia
De: Ildebrando Pereira da Silva

sábado, 28 de março de 2015

Idas da vida


Braços, pernas,
movimento, lento,
quase sem vida.
Vista curta, cansada,
coberta pela poeira
da estrada percorrida.
Voz embargada,
presa nos nós
da corda retorcida.
O silêncio
Ocupa o espaço
da sonoridade perdida.
A fragrância  da vitalidade,
pelo aroma da lembrança
foi substituída.
Ponto de chegada,
ou o marco da partida?
 
Do livro: Sob o olhar da poesia
De: Ildebrando Pereira da Silva

 

Eu mudo


 

Eu Mudo

 O tempo muda,

 As coisas mudam

 As pessoas mudam com o tempo

 E eu aqui mudo, surdo

 Mudo opinião, mudo foco

 E você também muda,

 Muda meu mundo

 Mundo, esse,

 Que mudou completamente

 Depois de te conhecer.

 

Alma Nua

Catadores de tralhas e sonhos


Milton Hatoum

27 Março 2015

 São centenas, talvez milhares os catadores de papel nessa megalópole. Puxam ou empurram carroças e catam objetos no lixo ou nas calçadas. É um museu de tralhas variadas: restos de materiais para construção, papel, caixas de papelão, embalagens de inúmeros produtos, e até mesmo objetos decorativos, alguns belos e antigos, desprezados por algum herdeiro.

 Há carroças exóticas, pintadas com desenhos de figuras pop, seres mitológicos, nuvens, pássaros e vampiros. Em Santana, vi uma carroça que lembrava um jinriquixá, só que maior do que o veículo asiático.

 Era puxada por um velho e transportava uma avó e seu netinho, sentados em pilhas de papel. Perguntei ao carroceiro quanto ele cobrava pelo transporte de passageiros.

"Depende... Pra perto daqui, cinco reais. Pra fora do bairro, cobro 15 ou 12, depende do passageiro e do dia. Não gasto gasolina, nem nada, é só força mesmo, amigo."

 E haja força, leitor. Mas esse meio de transporte é raro na metrópole. Quase todas as carroças só carregam quinquilharias, uma e outra exibem aforismos, poemas, ditados. Vi carroças líricas, políticas, filosóficas, cômicas, moralistas, anarquistas. Numa delas se lia: "A verdade é uma desordem... Alguém tem dúvida?".

 Noutra, pintada de verde e amarelo: "Aqui só carrego bagunça, mas sou homem de paz". A que mais me chamou atenção foi uma carroça linda, com uma pintura geométrica que lembra um quadro de Mondrian. Na lateral, estava escrito:

 "Carrego todo tipo de tralha, e carrego um sonho dentro de mim".

 Era uma carroça mineira, pois ostentava uma bandeira de Minas. Conversei um pouco com esse carroceiro de São João del-Rei. Acho que perdeu a desconfiança nas ruas paulistanas, pois não se esquivou de mim, e ainda me mostrou uma luminária de aço, fabricada em Manchester (1946). Esse objeto havia sido abandonado numa caixa de papelão e recolhido pelo caprichoso carroceiro de Minas.

 Especulei a origem da luminária e me indaguei: quantas páginas esse belo objeto tinha iluminado em noites do pós-guerra?

 Depois o carroceiro abriu uma caixa e me mostrou livros velhos, em língua alemã. Disse que tinha encontrado tudo numa mesma calçada do Jardim Europa, e agora ia vender os livros para um sebo. Ele me olhou e acrescentou:

  "Ando solto, não gosto de ser botado preso dentro de curral. A gente encontra cada coisa por aí... Só não encontra o que a gente sonha".

 Comprei a luminária desse filósofo ambulante, mas não me interessei pelos livros, que talvez sejam relidos por algum germanófilo de São Paulo.

 Sei que não é fácil encontrar um sonho nas ruas; mas encontrei carroceiros simpáticos e um assunto para escrever esta crônica.

 

Tags:

Milton Hatoum,

crônica, O Estado de S. Paulo

sexta-feira, 27 de março de 2015

Impossível


Como atingir:
A velocidade da luz,            
a imortalidade,                       
o infinito e a eternidade?


Impossível?                  

 Talvez não!

 Como sondar:
a retina,
o cérebro,
o pensamento e o futuro?

Impossível?                   

Talvez não!

 
O que fazer:
Para chegar aos teus braços,
conhecer o teu sabor,
invadir tua fortaleza                   
 e conquistar o teu amor?

 Impossível?

Completamente.

Até que proves     
O contrário!

Do livro: Sob o olhar da poesia
De: Ildebrando Pereira da Silva









quinta-feira, 26 de março de 2015

Autopsicografia


 
O poeta é um fingidor.
 Finge tão completamente
 Que chega a fingir que é dor
 A dor que deveras sente.
 
E os que leem o que escreve,
 Na dor lida sentem bem,
 Não as duas que ele teve,
 Mas só a que eles não têm.

 E assim nas calhas de roda
 Gira, a entreter a razão,
 Esse comboio de corda
 Que se chama coração.

 

FERNANDO PESSOA

 

Movimentos mágicos

 
O movimento da terra,
em sua órbita encerra
 infinita magia:
Transforma a tela escura,
em magnífica pintura,
a dádiva do dia.
 O movimento do teu abraço
No qual eu me enlaço,
É completa magia:
Afugenta a dor,
fortalece o amor
e à alma sacia.
 Teus lábios em movimento
são doce encantamento.
Magia repleta de luz.
Transformam teu sorriso,
no portal de um paraíso,
que por inteiro me seduz.

Do livro: sob o olhar da poesia
De: Ildebrando Pereira da Silva
 
 
 

 

Soneto de fidelidade


De tudo ao meu amor serei atento
 Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
 Que mesmo em face do maior encanto
 Dele se encante mais meu pensamento.


 Quero vivê-lo em cada vão momento
 E em seu louvor hei de espalhar meu canto
 E rir meu riso e derramar meu pranto
 Ao seu pesar ou seu contentamento
 
 E assim, quando mais tarde me procure
 Quem sabe a morte, angústia de quem vive
 Quem sabe a solidão, fim de quem ama

 Eu possa me dizer do amor (que tive):
 Que não seja imortal, posto que é chama
 Mas que seja infinito enquanto dure.
 
Vinícius de Moraes

O tempo passa ? Não passa


O tempo passa ? Não passa

 O tempo passa ? Não passa
 no abismo do coração.
 Lá dentro, perdura a graça
 do amor, florindo em canção.

 O tempo nos aproxima
cada vez mais, nos reduz
 a um só verso e uma rima
 de mãos e olhos, na luz.


Não há tempo consumido
 nem tempo a economizar.
 O tempo é todo vestido
 de amor e tempo de amar.
 

O meu tempo e o teu, amada,
 transcendem qualquer medida.
 Além do amor, não há nada,
 amar é o sumo da vida.


São mitos de calendário
 tanto o ontem como o agora,
 e o teu aniversário
 é um nascer a toda hora.
 
E nosso amor, que brotou
 do tempo, não tem idade,
 pois só quem ama escutou
 o apelo da eternidade.

Carlos Drummond de Andrade

quarta-feira, 25 de março de 2015

Colisão


Barraco humilde da favela,  
vela solta no oceano,         
ano após ano mais carente,
ente que sofre se esconde,
 onde a dor é habitante. 
Ante a um mundo desabando,
ando e não vejo saída. 
Ida sem chances de retornar.
Ar  que aos pulmões dilacera.  
Era da liberdade prisão.      
 Hão por certo de nos ajudar:
Dar o golpe de misericórdia!

Do livro: Sob o olhar da poesia
De: Ildebrando Pereira da Silva

Vida


Quisera compreender

os caminhos da nossa existência,

será o acaso a nos submeter

a sua conveniência?

Vida que vem,

vida que passa,

explique a razão

de tanto querer?

Oras é triste,

sem graça,

mas que ninguém

deseja perder.

O sonho do homem

é a eterna procura

inserida na humanidade,

lança-nos ao mundo

na grande aventura

ao encontro da felicidade.

Ser feliz é a razão

dos nossos dias,

se sofrer e chorar,

ou, sonhar e sorrir,

estrada de muitas vias,

cabe a nós escolher

qual delas seguir.

A vida é uma jornada

que nos ensina crescer,

infeliz da vida ceifada,

sem desabrochar,

sem direito de viver.

Sinto-me confuso,

em meu entendimento.

Não quero passar por intruso,

anseio espalhar felicidade,

felicidade colher.

Vivendo meus dias

um de cada vez,

deixo que o tempo

possa me levar,

resolvo os enigmas

com muita altivez,

meu tempo eu dedico

para amor semear.

 

Rudimar Hauenstein
 

terça-feira, 24 de março de 2015

Aborto poético


A gestação poética 

está delicada.  

O coração corre perigo.          

O poeta sem hesitar,

aborta o verso               

para continuar vivo.

Mundo inverso


Na casa de pau, o ferreiro enfrenta
o espeto da vida com dor no olhar.
Quem cedo madruga
a Deus pede ajuda, pois, logo se cansa
ao ver a esperança fugindo dos dedos,
ficando os anéis da mera ilusão.
Em terra de cego,
quem tem boca está com fome,
come milho e não tem fama
nem cama para se deitar.
Na falta de recurso,
pensa o coração:
Mais vale um amigo urso,
que cinco dedos na mão.

Do Livro: Sob o olhar da poesia
De: Ildebrando Pereira da Silva

A vida

"A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios. Por isso cante, chore, dance, viva a vida intensamente, antes que a cortina se feche e a peça termine sem aplausos". 
Chaplin.

segunda-feira, 23 de março de 2015

Seus olhos


Bolsa sem valores

Na bolsa de valores,
caiu a gratidão,
em baixa a justiça,
em queda a união.

A responsabilidade
está em declínio  constante,
e a honestidade,
não há o que a levante.

A liberdade, a temperança,
a fidelidade e a decência
caíram profundamente,
ao lado da coerência.

A amizade e o respeito
sumiram do pregão.
E uma bolsa sem valores
pode quebrar uma nação.

Do livro: sob o olhar da poesia
De: Ildebrando Pereira da Silva

Velhas árvores

Olha estas velhas árvores, mais belas
Do que as árvores novas, mais amigas:
Tanto mais belas quanto mais antigas,
Vencedoras da idade e das procelas...

O homem, a fera, e o inseto, à sombra delas
Vivem, livres de fomes e fadigas;
E em seus galhos abrigam-se as cantigas
E os amores das aves tagarelas.

Não choremos, amigo, a mocidade!
Envelheçamos rindo! envelheçamos
Como as árvores fortes envelhecem:

Na glória da alegria e da bondade,
Agasalhando os pássaros nos ramos,
Dando sombra e consolo aos que padecem!


Olavo Bilac, in "Poesias"

Poema classificado

 Recebi hoje a notícia de que este poema foi classificado entre 2812 inscritos para fazer  parte de  uma  coletânea de 250 trabalhos.

O poeta em Pessoa

Quem disse que o poeta finge?
Será que foi Platão?
Teria sido Camões?
Ou seria Drummond?

Quem disse que o poeta finge
E engana tanta gente
Fingindo que a sua dor
Da dos outros é diferente?

Quem disse que o poeta finge?
Só Fernando sabia bem,
Pois, tinha em sua Pessoa,
Tudo que o poeta tem.

Serra morta

A motosserra,
serra
a mata
da serra.
Serra
e mata
a vida
que a mata
encerra.

Do livro: Sob o olhar da poesia
De: Ildebrando Pereira da Silva

domingo, 22 de março de 2015

Minha terra tem palmeiras...

Canção do exílio

Minha terra tem palmeiras
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.

Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.

Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer eu encontro lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.

Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar sozinho, à noite
Mais prazer eu encontro lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.

Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem que ainda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.


Gonçalves Dias